Uma das principais polêmicas que existe quando se trata de registro de marcas no Brasil se refere aos direitos (ou seriam garantias?) que são assegurados ao depositante de pedido de registro de marca distribuído perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI.
Essa discussão acontece porque são frequentes os casos de depositantes (nomenclatura conferida pela Lei nº 9.279/96 para os titulares de pedidos de registro de marcas) que, após ingressarem com o pedido de registro de suas marcas no INPI, acabam desconhecendo que providências tomar diante de terceiros que são descobertos utilizando suas marcas sem qualquer autorização (na grande maioria das vezes, no mesmo segmento de mercado).
Que garantias são concedidas pela legislação brasileira ao depositante de pedido de registro de marca?
Que medidas pode tomar o depositante de um pedido de registro de marca diante do uso não autorizado de sua marca por terceiros?
Neste estudo, procuraremos responder a todas estas dúvidas, através de uma análise didática sobre as principais interpretações que são dadas aos artigos da legislação que regulamenta a Propriedade Industrial no Brasil – Lei nº 9.279/96 – que mais estão relacionados com toda essa problemática da área de Direito Marcário.
Os conceitos de depositante e de titular de uma marca
De uma forma didática, podemos conceituar Depositante de uma marca toda e qualquer pessoa, que seja titular de pedido de registro de marca ainda não apreciado em definitivo pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial, isto é, que ainda esteja pendente de decisão final.
Por outro lado, considera-se Titular de uma marca, aquele que já recebeu do INPI o deferimento do pedido de registro da sua marca, garantindo-lhe o uso exclusivo sobre ela em todo território nacional pelo prazo de 10 anos, que é renovável sucessivamente ao final de cada período.
Aplica-se os mesmos conceitos acima para os demais direitos que compõe a propriedade industrial e que igualmente estão previstos na Lei 9.279/96 (patentes, desenhos industriais e programas de computador), salvo no que refere aos prazos individuais de vigências de cada um deles.
Que garantias são concedidas a um depositante de pedido de registro de marca no Brasil?
Antes de mais nada é importante ressaltar que nossa opção pela expressão “garantias” ao invés de “direitos”, apesar de prevista no caput do artigo 130 da Lei 9.279/96, se dá exatamente por acreditarmos que ali esteja pairado o ponto central sobre o qual reside a problemática das prerrogativas que são dadas ao depositante de pedido de registro de marca no Brasil, pela lei acima mencionada, e de que forma elas podem ser exercidas pelos depositantes no combate ao uso não autorizado das suas marcas por terceiros.
Como já tratado em artigo anterior, vigora em nosso país o chamado Sistema Atributivo, segundo o qual considera-se proprietário de uma marca aquele que primeiro a registra perante o INPI, conforme está disposto no artigo 129 da Lei nº 9.279/96.
Art. 129. A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148.
Aos proprietários (titulares) de marcas no Brasil são garantidos direitos, direitos, estes, absolutos, plenos, já consolidados desde a concessão do registro, que estão previstos no artigo 130 da Lei 9.279/96 e que podem ser exercidos plenamente pelos seus titulares. São eles: (i) direito de ceder o registro ou o pedido de registro da marca, (ii) direito de licenciar o uso da marca e (iii) direito de zelar pela integridade moral e reputação da marca.
Para o titular de marca registrada, prevê a Lei 9.279/96 medidas capazes de combater a violação a qualquer dos direitos de marca pertencentes aos seus titulares, como, por exemplo, através do envio de notificações extrajudiciais, propositura de ações judiciais com pedidos liminares, dentre outras.
De outro lado, com relação às garantias concedidas ao depositante de pedido de registro de marca pela Lei de Propriedade Industrial, tema central do presente estudo, o debate se torna um pouco mais aprofundado.
Isto porque a própria Lei 9.279/96 provoca margem de dúvidas sobre se as garantias que são concedidas ao depositante de pedido de registro de marca, desde o momento em que o pedido é distribuído no INPI, é, de fato, um direito pleno e consolidado ou se, na verdade, se trata de um direito ainda em formação, que apenas se materializará como direito absoluto com a concessão do registro da marca. A este direito ainda em maturação a doutrina especializada chama de “expectativa de direito”.
Ora, se no Brasil, a titularidade (propriedade) sobre uma marca somente pode ser alcançada com o registro, em observância ao Sistema Atributivo (artigo 129 – LPI), como pode então a mesma legislação, em seu artigo 130, dizer que ao depositante de pedido de registro de marca são assegurados os mesmos direitos garantidos ao titular da marca registrada? No mínimo, contraditório, sobretudo para aqueles que fazem a leitura de ambos os dispositivos mas que não atuam diretamente na área de propriedade industrial.
Para nós, embora inserido no caput do artigo 130 da LPI, equivocadamente, pelo legislador infraconstitucional, quando deveria ser tratado em dispositivo legal próprio, ao depositante de pedido de registro de marca apenas é garantida uma expectativa de direito sobre aquela pretensão que ainda não foi decidida em definitivo pelo INPI, mas jamais um direito absoluto, pleno, como de uma primeira leitura do caput do artigo 130 da Lei 9.279/96 se poderia imaginar, a cujo patamar somente alcançar-se-á após a concessão do registro da marca, uma vez atendidos os requisitos legais.
E neste contexto, entendemos que pode, sim, o depositante de pedido de registro de marca se valer das prerrogativas indicadas no artigo 130 da Lei 9.279/96, com o objetivo de enfrentar as condutas praticadas por terceiros que venham colocar em risco suas garantias, enquanto depositante da marca for perante o INPI, ainda que sob a forma de expectativa de direito.
Que medidas pode tomar o depositante de um pedido de registro de marca diante do uso não autorizado de sua marca por terceiros?
Como já frisado, ao proprietário (titular) da marca é garantido, de forma expressa e inequívoca pela lei de propriedade industrial do país (artigo 130 LPI), direitos que passam pela possibilidade de ceder ou licenciar o uso da marca para terceiros até o de zelar pela integridade moral e reputação da marca.
O exercício de tais direitos pode ser realizado pelo titular da marca através de notificações extrajudiciais, propositura de ações judiciais, dentre outras medidas correlatas, tendo como embasamento legal os crimes praticados contra marcas registradas previstos nos artigos 189 e 190 da Lei 9.279/96.
Já para o depositante de pedido de registo de marca essa possibilidade também existe, ainda que se esteja discutindo a violação a uma expectativa de direito (em nossa opinião) e não a um direito pleno e consolidado.
Ao nosso ver, como a discussão voltar-se-á apenas para a “quebra” de uma expectativa de direito e não para direitos que são inerentes a uma marca já registrada, nos posicionamos no sentido de que o melhor embasamento legal a ser adotado, nestes casos, seja o de tipificar a conduta violadora, única e exclusivamente, nos crimes de concorrência desleal, enumerados nos incisos do artigo 195 da Lei de Propriedade Industrial.
Desta maneira, dúvidas não haveria de que o depositante do pedido de registro de marca estaria exercendo, plenamente, as garantias que lhes são dadas pela legislação brasileira, desde quando manifesta sua pretensão de ver registrada a sua marca frente ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial.
Conclusão
A conta de tudo que foi analisado neste breve estudo, reafirmamos nossa posição de que não há se falar em direitos para o depositante de pedido de registro de marca ainda em tramitação no INPI, mas tão somente de uma expectativa de direito ainda em formação, cuja plenitude apenas será alcançada com a concessão do registro definitivo.
Do mesmo modo, sustentamos o equívoco praticado pelo legislador da Lei 9.279/96 de não ter tratado, em dispositivo legal próprio, as prerrogativas garantidas ao depositante de pedido de registro de marca, preferindo fazê-lo no artigo 130, juntamente com os direitos pertencentes ao titular de marca registrada, gerando, assim, grandes dúvidas sobre o assunto.
Por fim, defendemos o cabimento da propositura de medidas extrajudiciais e judiciais pelo depositante de pedido de registro de marca, fazendo uso, como fundamentação legal de sua pretensão, os crimes de concorrência desleal previstos no artigo 195 da Lei de Propriedade Industrial, como maneira de repelir a prática de atos que venham a colocar em risco as prerrogativas que já possua, enquanto depositante, como também os direitos que venha a conquistar, após a concessão do registro ser deferida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial.
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